Integrantes da Frentas foram convidados após divulgação de nota pública
Nesta terça-feira (06), o Sistema de Justiça esteve no centro das discussões da comissão especial da Câmara dos Deputados, responsável pela análise da PEC 32/2020, que versa sobre a Reforma Administrativa. Inicialmente, entidades associativas haviam ficado de fora do debate promovido pela audiência pública, contudo, as associações foram convidadas ao final da tarde de ontem após a nota pública emitida pela Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público (Frentas).
Ao abrir a sessão, Renata Gil, presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e coordenadora da Frentas, ressaltou que a PEC favorece o apadrinhamento político. “Temos mais de um milhão de cargos para livre nomeação e aparelhamento do serviço público caso a reforma seja aprovada”, disse a magistrada, que seguiu seu pronunciamento chamando atenção para o desmonte do combate à corrupção: “Quando a gente mexe com a questão da estabilidade, importantes órgãos como Coaf, Receita Federal e todos os sistemas antilavagem e anticorrupção, perdem com essa interferência e ingerência política que, por certo, ocorrerá.”
A magistrada falou ainda da emenda que prevê a inclusão da magistratura e de membros do MP na reforma e foi enfática ao defender que a medida é inconstitucional. “Foi opção do legislador constituinte o regime diferido. Não pode ser alterado por PEC, é cláusula pétrea, é regime de separação de poderes. Quem diz isso não sou eu, é o Congresso Nacional, é o Supremo Tribunal Federal.”
Em sua participação, o presidente da Associação Nacional do Ministério Público (Conamp), Manoel Murrieta, corroborou com a fala de Renata Gil. “A Constituição demonstra seu verdadeiro valor em momentos de crise. Se a cada ventania nós a mudarmos, ela se torna frágil, o país se torna frágil”, ponderou. “A vontade do Constituinte originário não pode ser mudada a qualquer tempestade que se avizinha, ao contrário. Ela é nosso norte para atravessar a tempestade e chegar ao nosso porto seguro”.
Em resposta aos argumentos favoráveis à PEC 32 que citam economia ao erário, a presidente da AMB alegou que “a reforma não é a melhor solução para equilibrar as contas, porque busca cortar gastos às custas de direitos de agentes públicos que se dedicam integralmente ao bem coletivo. Estabilidade se relaciona à eficiência. Quando a gente trabalha em modificação da estabilidade, as suas consequências são gigantescas para o serviço público brasileiro”.
O deputado federal Tadeu Alencar (PSB/PE) também saiu em defesa da estabilidade. “Ela não serve para premiar servidor improdutivo, negligente, incompetente e, eventualmente, improbo. A estabilidade é para prestigiar a função pública, para que ela possa ser exercida com total autonomia, independência e atenção às Leis do Brasil e à sua Constituição, não a natureza de qualquer governo, seja de qual natureza for”, analisou.
Rogério Correia (PT/MG) elogiou a participação de Renata Gil e destacou que o texto da Reforma Administrativa é comumente distorcido por quem a defende. “Sempre que se chama alguém para fazer a defesa da PEC, não há quem faça a defesa desta PEC, podem fazer defesa de outras ideias, mas desta não vi ninguém. É bom para o relator sentir o que a sociedade está discutindo”, explicou.
“Se a gente quer um novo pacto, e me parece que a ideia da PEC seja essa, pelo menos em sua ideia inicial, a gente tem que refundar o serviço público na forma em que ele está estabelecido. Se essa é a discussão, não estamos preparados para isso. A gente vai criar novas garantias – parecidas com as da iniciativa privada – e a gente começa num novo momento”, pontuou Renata Gil ao ponderar os motivos que diferem o serviço público da iniciativa privada.
Também estiveram presentes na audiência pública o presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Luiz Antonio Colussi, e o presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Eduardo Brandão.
Produtividade
Ainda em sua participação na audiência pública, a presidente da AMB afirmou que a Reforma Administrativa não deve ser motivada pela eficiência dos servidores, uma vez que já existem mecanismos para acompanhar a produtividade do Judiciário. “Só como exemplo, eu cito a existência do Conselho Nacional de Justiça, Conselho Nacional do Ministério Público, as agências reguladoras, controladorias de Estado, de município, tribunais de contas, órgãos pesados, que geram custos à sociedade, que foram criados para cobrar eficiência e efetividade e a gente entende que esses pontos fora da curva que devam ter suas correções feitas através desses órgãos”.
De acordo com dados apresentados por Renata Gil, há 80 milhões de processos sobre os ombros dos juízes brasileiros, uma média de sete processos por dia para cada magistrado. “E não importa o tamanho desse processo. Uns têm 200 folhas, outros mil folhas, 400 mil folhas. Estão todos a cargo dos juízes”, alegou. “A produtividade vem a que custo? Um estudo do TRT da 15ª região aponta os dados do peso desse trabalho na saúde da magistratura brasileira. A fonte mais registrada para que os magistrados brasileiros adoeçam é exatamente o número excessivo de processos”, finalizou.
Júlia Rodrigues (ASCOM)